terça-feira, março 08, 2005

Casablanca revisitada




Percorro as ruas de Casablanca. Nem estranho que tudo esteja como no filme que sempre considerei “o meu filme”. Coisas de rapariga romântica.
Por isso, o café do Rick está ali bem em frente de mim e, do mercado/bazar onde Ilsa andou às compras, vêm cheiros intensos de tâmaras e especiarias. Aproximo-me e olho os tecidos coloridos. Gostava de levar comigo alguns mas nunca tive jeito para regatear e não sei se o vendedor me fará um desconto especial por ser amiga de Rick. Um polícia aproxima-se …capitão Renault?

(Só porque o homem era francês tinham que lhe dar o nome de uma marca de automóveis?)

Insinuante, pergunta-me quem sou e se me pode ser útil em alguma coisa. Ora… ele julga que eu não vi o filme? O tipo de utilidade que ele pensa que tem não me interessa.
Eu venho mesmo é à procura de um herói. Qual? Não sei ainda. Mas, se estão cá todos, posso sempre tentar entender se prefiro Rick ou Laszlo. Foi sempre uma dúvida fundamental na minha visão do filme.
Entro no café de Rick. Não vale a pena adiar. Olho aquelas mesas antigas na penumbra e lá está o piano. É de dia… será que? Sorte a minha! Sam está sentado em frente ao piano. A ensaiar.

(Para que precisa ele de ensaiar? Toca aquela melodia há sessenta e tal anos…)

As notas de “As time goes by” espalham-se pelo espaço do café. A atmosfera está perfeita. Mas… há alguma tristeza no olhar de Sam. Claro que a amizade com que Rick o trata não subverte o facto de ele ser negro e Rick americano. Está ali para servir. “Play it again, Sam!”.
Sento-me numa mesa e espero. Rick aparece, vindo do fundo do café. Não posso negar as batidas do meu coração. Herói, anti-herói, Rick preencheu sempre o meu imaginário. Porque será que espero que ele diga “Of all the gin joints in all the towns in all the world, she walks into mine.”?
Mas não diz. Senta-se na mesa sem convite, olha-me com aquele olhar de tristeza sedutora, pede uma bebida para mim, levanta o copo que traz sempre na mão e diz :”Here’is looking at you, kid!”. E vai-se embora, qual imagem congelada na sua espera eterna de Ilsa que só a “beautiful friendship” com o capitão Renault parece consolar.

(Não, Rick não é o meu herói. Demasiados clichés para um herói. E nem sequer posso dizer que “We’ll always have Paris”).

Falta-me ver Laszlo. Foi-se embora, no filme. Será que alguma imagem dele não ficou por aqui? Entro no “Blue Parrot”, talvez ele se materialize por lá. Vou pensando em como Laszlo é perfeito. Resistente, combativo, íntegro, amante/amigo. E mais bonito que Rick, convenhamos. Embora sem tanto charme. Um homem de causas. Afinal, também ele um conjunto de clichés.

(E se o homem interrompe alguma cena amorosa para cantar a Marselhesa, só para mostrar a sua militância? Sempre me pareceu com alguma falha de sex-appeal…)

Laszlo não aparece e eu sei que ele também não é o meu herói.

Para mim, é altura de saltar fora da tela do cinema. Mas que ideia… Quero mesmo é voltar a ver o filme, onde eles mantêm aquele encanto intemporal. E cantarolar “You must remember this…”.

14 Comentaram:

Blogger Daniel Aladiah disse...

Querida Lique
Belíssima análise do ponto de vista feminino. Sempre me incomodou a lealdade da Ilsa, mas estávamos nos anos 40, será que agora o enredo seria possível? Revi, recentemente, o filme Havana, com Robert Redford, e é um remake moderno de Casablanca, viste?
Um beijo
Daniel

10:00 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

Pobre Ilsa qualquer que fosse a sua decisão (ou a decisão que por ela tomassem) tinha tanto a perder...O magnetismo másculo e a generosidade oculta sob o sarcasmo de Rick, a coerência, a coragem, o cavalheirismo de Viktor...complicado! E ambos a amavam e estou certa que ela amava os dois, embora estivesse apaixonada por Rick. Tanta matéria para sonhar, lique! Quantas vezes em fantasias várias não fomos Ilsa Lund? Tens razão apetece rever o filme, pronunciar as frases mais famosas ao mesmo tempo que os actores, comover-nos com a nobreza de Rick para com o noivo angustiado e a bravura de Viktor com os alemães. Aceitemos a piscadela de olho de Renault. No filme tudo é perfeito...

12:34 da manhã  
Anonymous Anónimo disse...

E vim a correr, Lique.

claro, valeu a pena!

Também nunca resisto a rever o Casablanca.

Romantismo meu ou qualidade real de todo o filme?

Beijinho.

Madalena

11:36 da manhã  
Anonymous Anónimo disse...

As time goes by é lindo. Tenho duas versões desta musica. E o filme, um clássico com certeza, e é bom q assim permaneça, afinal, é nossa imaginação que dá asas ao amor.
bjos

2:03 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

Quem resiste a rever o romantismo na sua forma mais pura? Eu não, de certeza... sou uma incorrigivel romântica...
Abraço ;-)

4:43 da tarde  
Blogger wind disse...

Lique, extraordinário texto que me trouxe todas as memórias do filme. Visualizei tudo o que estava escrito. Cada vez melhor:)Muitos beijos:)***

7:16 da tarde  
Blogger SaoAlvesC disse...

um dos meus filmes favoritos... desde sempre. e mt boa a tua análise.
ainda não tinha visto este teu novo eu ;)
bj grande.

10:02 da tarde  
Blogger sotavento disse...

Hum...
Então é aqui que estás quando não estás ali (ou noutro lado qualquer, claro)!...
E, pelo que vejo, mostras filmes, do lado de dentro!... :)

11:29 da tarde  
Blogger Conceição Paulino disse...

Belíssima e vívida revisitação a um igualmente belo filme. Gostei mtº desta visita. Bjs e ;)

8:16 da manhã  
Blogger Unknown disse...

Casablanca sempre. Um dos filmes da minha vida. Mas, como diz a Encandescente, a preto e branco. E cá vou eu ouvir o as time goes by :) excelente a tua "visita" ao filme. bjks

8:01 da tarde  
Blogger musalia disse...

as maiores felicidades para este teu novo espaço! estareipresente, nem podia deixar de ser!
beijinhos, querida Lique e gosto muito de Casablanca :)

10:07 da tarde  
Blogger JFC disse...

Eu escreve: amo ser o tipo aos polpos e naturalmente simple! Ola! Tu sim?

12:40 da manhã  
Blogger lique disse...

Daniel: Aquele enredo seria sempre possível. Afinal a lealdade ainda não caiu em desuso. :)

Dora: eu fui desafiar-te porque queria mesmo ler o teu comentário. No que respeita a cinema, tu é uma autoridade que eu respeito. Obrigada por teres vindo.

Manuel: I will, my friend, I will. :)

mão de vento: por alguma razão, o filme é idolatrado por tanta gente. Penso que tem todos os ingredientes para se instalar de vez no nosso imaginário.

liliane: bem vinda, também. Compartilho do teu entusiasmo.

menina marota: também eu, amiga. Por isso revejo o filme tantas vezes.

antonio: este filme é indispensável em qualquer videoteca. Obrigada por teres vindo.

12:30 da tarde  
Blogger lique disse...

wind: obrigada, amiga. Fico feliz por teres gostado.

pandora: espero que tenhas gostado do meu "eu" alternativo. Eu gostei de ver por aqui o "CUBEMBOM" :))

sotavento : estou menos por aqui que por ali! :) O cinema é uma das minhas paixões.

tmara: obrigada pelas tuas palavras. Ainda bem que gostaste.

vulcão: ai, ai, tu e a tua parceira de blog fazem-me sentir remorsos. Mas não houve intenção de magoar ninguém, juro. Não houve exactamente uma divulgação. Enfim, desculpa, de qualquer forma. A porta está aberta, tu sabes!

encandescente: a preto e branco, pois claro. É a versão que acentua o romantismo original. E a beleza da imagem.

ognid: então põe lá "As time goes by" na tua play-list :)

musalia: obrigada pelos votos e conto contigo por aqui.

malapata: não entendi muito bem o que escreveste mas obrigada por teres vindo. Irei visitar-te para tentar entender.

Beijinhos e abraços para todos

12:42 da tarde  

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